DAS FOLHAS AMARELADAS ÀS TELONAS

Acervo de jornais do Arquivo Público mostra os cinemas de rua que fizeram história em Cuiabá

Segunda-feira, 28 de agosto de 2023 | Publicado às 13h01

De 2015 a 2023, investimentos no setor audiovisual em Mato Grosso foram de mais de R$ 35 milhões, o que indica que a relação com o cinema ainda é presente

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Foto: Cristiano Emanuel

A relação de Cuiabá com as telonas é de muito tempo. O Arquivo Público de Mato Grosso fez um levantamento das notícias e anúncios sobre cinema nos antigos jornais de Mato Grosso. O acervo possui 30 mil edições de jornais impressos de aproximadamente 400 veículos que atuaram no Estado.

A publicação mais antiga é uma nota no jornal “O Commercio”, de 14 de outubro de 1911. A notícia traz os filmes que seriam exibidos no Cinema Ideal. Os títulos vão da comédia ao terror.

Em 11 de agosto de 1912, outra nota no jornal “A Reação” fala sobre a exibição de filmes dentro das igrejas. Prática que era muito comum nas cidades do interior.

O Brasil teve sua primeira exibição fílmica em 08 de julho de 1896, no Rio Janeiro. Cuiabá viveria a mesma experiência 14 anos depois, em 1910, no centro da capital.

“Assim, os residentes, pela primeira vez, tiveram acesso ao cinema, concebido como um espaço de lazer, educação e cultura”, de acordo com o livro Cinema e Audiovisual em Mato Grosso. O cinema também era palco das discussões ideológicas entre os cidadãos

Cine Parisien

Inaugurado em 1912, exibindo filmes do cinema mudo, o Parisien é considerado o primeiro cinema de Cuiabá e movimentou o cotidiano da população cuiabana até o ano de 1930, quando encerrou suas atividades.

A antiga sala de cinema, na Avenida Getúlio Vargas, deu lugar ao Cine Teatro República. O local foi demolido para a construção do Grande Hotel. Hoje, o prédio é conhecido como edifício Júlio Muller e passa por reformas.

Os filmes eram reproduzidos por máquinas de manivela, operadas por projecionistas. Com a chegada da luz elétrica em 1919, as manivelas foram deixadas de lado. Os primeiros filmes exibidos pelo Parisien eram curtas metragens; após a década de 20, o cinema passou a projetar filmes maiores.

Os jornais faziam elogios e críticas aos filmes exibidos e divulgavam sua programação. Como mostram as edições guardadas no Arquivo Público de Mato Grosso.

No acervo há também o anúncio de outras salas de cinema em Cuiabá. É o caso do Cine Bandeirantes, o “lançador de sucessos”, como o jornal ‘O Estado de Mato Grosso’ se refere ao espaço. Com uma sala ampla, poltronas confortáveis revestidas em couro, o Bandeirantes foi inaugurado na década de 1960 na Rua Pedro Celestino, centro de Cuiabá.

Matéria do Jornal O Estado de Mato Grosso de 20 de março de1958. (Crédito: Acervo Arquivo Público)

Os jornais da época também noticiavam a nova administração das salas de cinema do Cine Teatro e Cine Bandeirantes, que já pertenceram aos mesmos donos. Exibindo sucessos nacionais e internacionais, ‘Meu Pé de Laranja Lima’ e ‘Aeroporto’, respectivamente.  

Memórias e nostalgia

Marita Reis, professora de inglês e ex-frequentadora do Cine Bandeirantes, relata que houve sessões que foram sucesso de público, mas a sala de exibição não comportava a todos para assistir. “As pessoas sentavam no chão, no espaço entre as poltronas”, relembra.

Ainda nas memórias da professora, além dos filmes, a sorveteria Alaska em frente ao cinema era mais um atrativo.

“O fato de ter uma sorveteria na porta do cinema era o que mais atraia as pessoas. A coisa mais gostosa era ir ao cinema e tomar soverte, antes ou depois das sessões. Este era o diferencial do Cine Bandeirantes”, lembrou Marita.

O Bandeirantes também exibiu um dos maiores romances do cinema: Titanic. Sucesso no final da década de 1990, o filme arrastou multidões para as salas de cinema.

“As pessoas tiravam foto da tela quando aparecia o Leonardo Di Caprio. Era o só flash das máquinas fotográficas na sala”, lembra Marita. Ela também conta que a sessão ficou repleta de pessoas para assistirem ao filme.

O Cine Bandeirantes encerrou as atividades em 2001. O último filme projetado foi a comédia ‘Entrando Numa Fria”, com Robert De Niro e Ben Stiller.

Legado do Cine Teatro

Desses espaços, apenas o Cine Teatro Cuiabá conseguiu atravessar as barreiras do tempo. Inaugurado em 1942, o espaço comportava até 600 pessoas na época. A ideia do local era atender as demandas do povo cuiabano por um espaço onde pudessem consumir mais arte e assistir a mais filmes.

O Cine Teatro iniciou suas atividades em meio ao burburinho dos jornais da época e da população a respeito de qual filme seria exibido na estreia. O escolhido, foi o longa ‘A noiva veio como encomenda’, de 1941, estrelado pela atriz norte-americana Bette Davis.

Em 1958, o Cine Teatro Cuiabá dá mais um passo rumo à modernização cinematográfica: o Cinemascope - nova tecnologia em câmeras que alterou as antigas maneiras de filmar e projetar os filmes. As imagens pequenas e achatadas deram lugar a imagens mais horizontalizadas - o famoso efeito ‘tela cheia’ que percebemos nos cinemas atuais.

Em 1984, o Cine Teatro Cuiabá foi tombado como patrimônio histórico de Cuiabá pela Secretaria de Estado Cultura, Esporte e Lazer (Secel-MT).

De acordo com os dados da Secel, de 2015 a 2023, foram investidos R$ 36,2 milhões no setor audiovisual em Mato Grosso. Em 2018, foi instituído o único curso de cinema e audiovisual do Estado, na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).


Fonte: Jorge Gabriel | Seplag - MT